A expressão woke, que em inglês significa literalmente “acordado”, nasceu como um alerta contra injustiças sociais, sobretudo o racismo. Seu uso remonta às décadas de 1940 e 1960, dentro das comunidades afro-americanas, em um contexto de luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. Era uma palavra carregada de sentido moral: “mantenha-se acordado”, “não se deixe enganar pelo sistema”. O termo circulava em músicas, discursos e conversas como um chamado à vigilância diante das estruturas de opressão, principalmente num período em que leis e costumes ainda discriminavam abertamente a população negra.
Durante muito tempo, woke permaneceu como um código cultural restrito a determinados grupos. Mas, a partir dos anos 2000, ganhou nova força e visibilidade, impulsionado por casos de violência policial e pelo surgimento do movimento Black Lives Matter. As redes sociais ampliaram sua presença e, de uma expressão usada em nichos, woke se tornou global. Nesse processo, seu significado se expandiu: deixou de ser apenas um chamado contra o racismo e passou a englobar uma série de pautas identitárias, como direitos LGBTQIA+, feminismo, ambientalismo e a reinterpretação de narrativas históricas a partir de perspectivas anticoloniais.
Essa ampliação, no entanto, trouxe mudanças profundas. O que antes era um grito por justiça passou a ser um sistema com regras próprias, que pressiona indivíduos, instituições e até empresas a se alinharem publicamente a determinadas causas. É daí que surge a chamada “cultura do cancelamento”, na qual vozes discordantes são excluídas ou difamadas por não se enquadrarem no discurso dominante. Para defensores, esse é um avanço moral; para críticos, trata-se de um novo tipo de intolerância, que se apresenta como libertadora, mas que frequentemente ceifa a liberdade de expressão.
No campo artístico, a Cultura Woke exerce enorme influência. O cinema de Hollywood é um exemplo claro: produtores e estúdios passaram a seguir diretrizes de representatividade para elencos, roteiros e mensagens, muitas vezes priorizando a aderência ideológica à história a ser contada. Filmes e séries são moldados não apenas para entreter, mas para transmitir um recado político alinhado a esse novo código cultural. A arte deixa de ser apenas expressão criativa e se torna, em muitos casos, veículo de militância.
É nesse ponto que o cinema sente os efeitos mais diretos. Por natureza, o olhar católico sobre a arte parte de uma visão integral do ser humano, enraizada na dignidade da pessoa criada à imagem e semelhança de Deus. Isso significa que, mesmo ao tratar de questões sociais ou culturais, a narrativa católica subordina tudo à verdade moral e à dimensão espiritual. Essa postura contrasta com o paradigma woke, que coloca identidades e disputas sociopolíticas no centro da narrativa. O resultado é um choque de cosmovisões: enquanto um enxerga a redenção e a transcendência como objetivo último, o outro vê a emancipação política ou cultural como meta final.
Embora muitas produções com viés woke entrem em conflito com os valores cristãos e, em alguns casos, não tenham a adesão do público, não se pode ignorar que várias delas alcançam sucesso comercial e batem recorde em bilheterias. Um exemplo é Pantera Negra (2018), que arrecadou mais de 1,3 bilhão de dólares e se tornou um fenômeno ao reforçar uma narrativa fortemente marcada pelo protagonismo negro pelo discurso antirracista. Outro caso é Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (2022), ganhador de sete estatuetas, incluindo a de Melhor Filme, que combinou elementos de ficção científica com abordagens LGBTQIA +, de diversidade e aceitação.
O sucesso desses títulos mostram que nem sempre a cultura woke é rechaçada pelo público. Pelo contrário: em algumas ocasiões, mesmo carregando pautas ideológicas evidentes, essas produções conseguem atrair grande audiência e gerar lucros expressivos. Isso incentiva os estúdios a repetir a fórmula e a exigir a presença dessas narrativas no cinema e na TV. O resultado é que o público muitas vezes consome essas obras sem perceber que, junto com o entretenimento, está absorvendo um conjunto de valores e visões de mundo alinhados a essa agenda.
No entanto, essa forte aderência ao mercado — ainda que não seja considerada legítima pelas próprias “minorias”, uma vez que eles percebem que as indústrias buscam mais pelo lucro do que pela representatividade em si — tem consequências práticas. Obras católicas muitas vezes enfrentam barreiras de distribuição e divulgação, especialmente em ambientes culturais onde o woke é dominante. Filmes que abordam temas como conversão, sacrifício e valores familiares podem ser rotulados como “conservadores” e, por isso, considerados fora de sintonia com as expectativas do público moldado por esse discurso. Além disso, cineastas católicos podem sofrer pressão para adaptar roteiros ou personagens de modo a se alinhar à estética e às agendas do momento, o que, se aceito sem discernimento, pode diluir a essência da mensagem cristã.
Ainda assim, há resistência. Alguns atores e diretores católicos têm se posicionado publicamente contra a imposição cultural do woke, defendendo produções que preservem valores cristãos. Um exemplo é Jim Caviezel, conhecido por seu papel como Jesus em A Paixão de Cristo, que tem criticado abertamente as pressões ideológicas de Hollywood e buscado participar de obras coerentes com sua fé. Do lado dos estúdios, iniciativas como a Angel Studios mostram que é possível produzir conteúdo de alto nível sem abrir mão da identidade cristã. Além de sucessos como The Chosen e Sound of Freedom, o estúdio prepara Zero A.D., uma superprodução que promete contar a história dos primeiros anos do cristianismo com fidelidade histórica e teológica, resistindo à tentação de adaptar o enredo às ideologias dominantes.
Para o católico que consome cultura — e, especialmente, para quem a produz —, compreender a Cultura Woke não é opcional. É preciso saber reconhecer o que nela há de legítimo, como a denúncia contra injustiças reais, mas também discernir seus desvios, quando coloca ideologias acima da verdade ou instrumentaliza a arte para moldar o imaginário segundo uma agenda política. A Igreja sempre defendeu o compromisso com a justiça social, mas também sempre alertou contra reduções materialistas do ser humano, que ignoram uma visão transcendental do mundo.
No fim, o desafio para o artista e o católico é duplo: resistir à tentação de se submeter cegamente ao establishment¹, e ao mesmo tempo, encontrar formas inteligentes de dialogar com o mundo atual. Isso exige conhecer bem as origens e transformações da Cultura Woke, entender como ela se manifesta nas artes e, sobretudo, manter os olhos fixos no que não muda: a verdade que liberta, e não apenas “acorda”.
1. O termo establishment refere-se ao conjunto de pessoas, instituições e grupos de poder que não só ocupam posições de influência e controle em uma sociedade, como moldam decisões políticas, culturais e sociais, mantendo o status quo e resistindo a mudanças que possam ameaçar seus interesses.
A expressão woke, que em inglês significa literalmente “acordado”, nasceu como um alerta contra injustiças sociais, sobretudo o racismo. Seu uso remonta às décadas de 1940 e 1960, dentro das comunidades afro-americanas, em um contexto de luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. Era uma palavra carregada de sentido moral: “mantenha-se acordado”, “não se deixe enganar pelo sistema”. O termo circulava em músicas, discursos e conversas como um chamado à vigilância diante das estruturas de opressão, principalmente num período em que leis e costumes ainda discriminavam abertamente a população negra.
Durante muito tempo, woke permaneceu como um código cultural restrito a determinados grupos. Mas, a partir dos anos 2000, ganhou nova força e visibilidade, impulsionado por casos de violência policial e pelo surgimento do movimento Black Lives Matter. As redes sociais ampliaram sua presença e, de uma expressão usada em nichos, woke se tornou global. Nesse processo, seu significado se expandiu: deixou de ser apenas um chamado contra o racismo e passou a englobar uma série de pautas identitárias, como direitos LGBTQIA+, feminismo, ambientalismo e a reinterpretação de narrativas históricas a partir de perspectivas anticoloniais.
Essa ampliação, no entanto, trouxe mudanças profundas. O que antes era um grito por justiça passou a ser um sistema com regras próprias, que pressiona indivíduos, instituições e até empresas a se alinharem publicamente a determinadas causas. É daí que surge a chamada “cultura do cancelamento”, na qual vozes discordantes são excluídas ou difamadas por não se enquadrarem no discurso dominante. Para defensores, esse é um avanço moral; para críticos, trata-se de um novo tipo de intolerância, que se apresenta como libertadora, mas que frequentemente ceifa a liberdade de expressão.
No campo artístico, a Cultura Woke exerce enorme influência. O cinema de Hollywood é um exemplo claro: produtores e estúdios passaram a seguir diretrizes de representatividade para elencos, roteiros e mensagens, muitas vezes priorizando a aderência ideológica à história a ser contada. Filmes e séries são moldados não apenas para entreter, mas para transmitir um recado político alinhado a esse novo código cultural. A arte deixa de ser apenas expressão criativa e se torna, em muitos casos, veículo de militância.
É nesse ponto que o cinema sente os efeitos mais diretos. Por natureza, o olhar católico sobre a arte parte de uma visão integral do ser humano, enraizada na dignidade da pessoa criada à imagem e semelhança de Deus. Isso significa que, mesmo ao tratar de questões sociais ou culturais, a narrativa católica subordina tudo à verdade moral e à dimensão espiritual. Essa postura contrasta com o paradigma woke, que coloca identidades e disputas sociopolíticas no centro da narrativa. O resultado é um choque de cosmovisões: enquanto um enxerga a redenção e a transcendência como objetivo último, o outro vê a emancipação política ou cultural como meta final.
Embora muitas produções com viés woke entrem em conflito com os valores cristãos e, em alguns casos, não tenham a adesão do público, não se pode ignorar que várias delas alcançam sucesso comercial e batem recorde em bilheterias. Um exemplo é Pantera Negra (2018), que arrecadou mais de 1,3 bilhão de dólares e se tornou um fenômeno ao reforçar uma narrativa fortemente marcada pelo protagonismo negro pelo discurso antirracista. Outro caso é Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (2022), ganhador de sete estatuetas, incluindo a de Melhor Filme, que combinou elementos de ficção científica com abordagens LGBTQIA +, de diversidade e aceitação.
O sucesso desses títulos mostram que nem sempre a cultura woke é rechaçada pelo público. Pelo contrário: em algumas ocasiões, mesmo carregando pautas ideológicas evidentes, essas produções conseguem atrair grande audiência e gerar lucros expressivos. Isso incentiva os estúdios a repetir a fórmula e a exigir a presença dessas narrativas no cinema e na TV. O resultado é que o público muitas vezes consome essas obras sem perceber que, junto com o entretenimento, está absorvendo um conjunto de valores e visões de mundo alinhados a essa agenda.
No entanto, essa forte aderência ao mercado — ainda que não seja considerada legítima pelas próprias “minorias”, uma vez que eles percebem que as indústrias buscam mais pelo lucro do que pela representatividade em si — tem consequências práticas. Obras católicas muitas vezes enfrentam barreiras de distribuição e divulgação, especialmente em ambientes culturais onde o woke é dominante. Filmes que abordam temas como conversão, sacrifício e valores familiares podem ser rotulados como “conservadores” e, por isso, considerados fora de sintonia com as expectativas do público moldado por esse discurso. Além disso, cineastas católicos podem sofrer pressão para adaptar roteiros ou personagens de modo a se alinhar à estética e às agendas do momento, o que, se aceito sem discernimento, pode diluir a essência da mensagem cristã.
Ainda assim, há resistência. Alguns atores e diretores católicos têm se posicionado publicamente contra a imposição cultural do woke, defendendo produções que preservem valores cristãos. Um exemplo é Jim Caviezel, conhecido por seu papel como Jesus em A Paixão de Cristo, que tem criticado abertamente as pressões ideológicas de Hollywood e buscado participar de obras coerentes com sua fé. Do lado dos estúdios, iniciativas como a Angel Studios mostram que é possível produzir conteúdo de alto nível sem abrir mão da identidade cristã. Além de sucessos como The Chosen e Sound of Freedom, o estúdio prepara Zero A.D., uma superprodução que promete contar a história dos primeiros anos do cristianismo com fidelidade histórica e teológica, resistindo à tentação de adaptar o enredo às ideologias dominantes.
Para o católico que consome cultura — e, especialmente, para quem a produz —, compreender a Cultura Woke não é opcional. É preciso saber reconhecer o que nela há de legítimo, como a denúncia contra injustiças reais, mas também discernir seus desvios, quando coloca ideologias acima da verdade ou instrumentaliza a arte para moldar o imaginário segundo uma agenda política. A Igreja sempre defendeu o compromisso com a justiça social, mas também sempre alertou contra reduções materialistas do ser humano, que ignoram uma visão transcendental do mundo.
No fim, o desafio para o artista e o católico é duplo: resistir à tentação de se submeter cegamente ao establishment¹, e ao mesmo tempo, encontrar formas inteligentes de dialogar com o mundo atual. Isso exige conhecer bem as origens e transformações da Cultura Woke, entender como ela se manifesta nas artes e, sobretudo, manter os olhos fixos no que não muda: a verdade que liberta, e não apenas “acorda”.
1. O termo establishment refere-se ao conjunto de pessoas, instituições e grupos de poder que não só ocupam posições de influência e controle em uma sociedade, como moldam decisões políticas, culturais e sociais, mantendo o status quo e resistindo a mudanças que possam ameaçar seus interesses.
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