Maternidade e cinema: entrevista com Julia Sondermann
Por Redação Lumine
|
30.maio.2025
Midle Dot

Julia Sondermann é roteirista, diretora, mãe de três filhos e co-fundadora da Lumine — a maior plataforma de streaming católico da América Latina, criada por ela e seu esposo, Matheus Bazzo.

Nesta entrevista, ela compartilha como a maternidade intensificou a sua sensibilidade e transformou a sua trajetória no cinema. 

1. Você se lembra do momento em que decidiu que queria trabalhar com cinema? Como essa decisão colidiu com a maternidade?

Meu interesse pelo cinema veio desde muito cedo. Eu sempre assisti a muitos filmes. Alguns desses filmes me impactavam de um jeito tão profundo que despertavam em mim uma vontade de provocar nos outros o mesmo tipo de emoção. Sentia-me muito movida por esse desejo de criar histórias que pudessem também tocar a vida de outras pessoas. 

Segui minha vida profissional com esse sentimento como pano de fundo e, quando me casei, estávamos prestes a lançar a Lumine. Tive a oportunidade de me dedicar inteiramente à empresa no seu primeiro ano — foi um momento de entrega total à criação e ao propósito da Lumine. Logo em seguida, nasceu meu primeiro filho.

A pergunta sobre como essa decisão se cruzou ou colidiu com a minha jornada como mãe é ótima porque, na verdade, foi exatamente isso: uma colisão de mundos. Dois universos completamente diferentes se chocando. E, apesar do desafio de conciliar a maternidade com a vida criativa e empreendedora, percebo que foi justamente nesse encontro — ou talvez nesse conflito — que minha criatividade foi realmente colocada à prova.

2. Antes da maternidade, como você imaginava que seria conciliar a carreira no audiovisual com a vida de mãe?

Antes da maternidade, para ser honesta, eu não me preocupava muito com como seria conciliar a carreira com a vida de mãe. Meu foco sempre foi fazer o melhor com aquilo que estivesse ao meu alcance. Talvez tenha sido até uma ingenuidade não pensar que a vida de mãe teria implicações na minha vida profissional.

Porém, em certo sentido, alguns aprendizados da vida profissional me ajudaram quando me tornei mãe. No trabalho, somos constantemente chamadas a dar o nosso máximo e fazer as coisas com excelência. Ficou muito claro para mim, desde o início da minha carreira, que, para se destacar, você precisa ser excelente.

Vejo hoje que esse modo de se posicionar diante dos desafios me ajudou a pensar a vida como mãe. Independentemente da fase da vida ou do desafio, meu objetivo precisava ser esse de me entregar com excelência ao que estou fazendo. 

Como profissional, cada novo filme, cada novo projeto era (e ainda é) uma oportunidade. Então, eu não antecipei tanto como seria essa conciliação. Simplesmente segui com a certeza de que, onde eu estivesse, daria o meu melhor. 

3. O que muda no seu olhar como roteirista e diretora depois da maternidade?

Depois da maternidade, a vida adquiriu um peso diferente e, com isso, meu olhar como roteirista e diretora também mudou. Lembro de estar assistindo a um filme do diretor grego Theo Angelopoulos, em que havia uma cena em que uma criança estava perdida e um senhor tentava levá-la de volta aos pais — fui profundamente tocada por aquilo.

Aquela cena me atravessou de um jeito que, talvez, antes de ser mãe, não teria me atravessado com tanta força. A maternidade intensificou minha sensibilidade. Tudo passou a ser sentido com mais profundidade — a dor do personagem, o silêncio, a ausência, o amor.

O drama do mundo, a verdade humana, nos é revelada de forma mais crua quando nos tornamos pais. Isso transforma a maneira como contamos histórias. Passamos a enxergar nuances que talvez antes passassem despercebidas.

Os filhos nos trazem isso, eles nos jogam diante desse drama e dessa beleza que é a vida. Sem esse referencial da maternidade, eu talvez nunca tivesse noção da gravidade real das coisas. É natural que essa consciência também me ajude no trabalho como roteirista porque, ao construir um personagem, eu tenho mais material humano para compreender seu mundo, suas questões, etc.

4. Já se sentiu dividida entre estar num set e estar em casa? Como lida com essa divisão emocional?

Cada mãe carrega uma história única, com desafios e descobertas muito próprios. A maternidade, com toda sua beleza, também nos apresenta fases desafiadoras. Em meio a tudo isso, algo que procuro sempre lembrar é que essas fases, por mais difíceis que pareçam, são passageiras.

Quando meu primeiro filho nasceu, minha rotina e minhas responsabilidades haviam mudado e, naquele momento, isso me levou a redirecionar minha atuação. Passei a trabalhar mais intensamente com roteiro, que permite uma flexibilidade maior, e a me afastar dos sets — que exigem longas horas de concentração e presença física, algo que minha realidade naquele momento não permitia.

Comecei então a focar mais na pré e pós-produção. De forma muito natural, comecei a me dedicar mais aos conteúdos da Lumine Kids. Como grande parte dessas produções — especialmente as animações — acontecem quase totalmente online, encontrei ali uma forma de adaptar o processo cinematográfico à minha nova realidade.

Essa divisão emocional entre estar no set e estar em casa existe, sim, mas busquei transformá-la em uma adaptação consciente, entendendo que há tempo para tudo.

5. Existe alguma cena que você escreveu ou dirigiu que hoje enxerga de um jeito totalmente novo por causa da maternidade?

Acredito que não — mas, ao mesmo tempo, percebo como a maternidade está profundamente entrelaçada com o que crio. Muitas vezes, situações da minha própria vida acabam se transformando em parte das nossas produções.

Um exemplo disso é o filme e livro infantil da Lumine, O Mistério do Sino que Nunca Parava de Tocar. Ele foi inspirado no meu filho mais velho, que, quando pequeno, era completamente fascinado por sinos. 

Passava o dia brincando com os oito sinos que ganhou de aniversário de uma amiga minha, e, à noite, me pedia histórias sobre sinos. Foi nesse ritual de contar e recontar histórias que esse filme foi nascendo. Quando percebi, eu estava com uma história pronta.

Icone

Receba nossos e-mails

Novos artigos, recomendações de filmes, trailers, lançamentos e muito mais. Não muito — apenas o suficiente.

Julia Sondermann é roteirista, diretora, mãe de três filhos e co-fundadora da Lumine — a maior plataforma de streaming católico da América Latina, criada por ela e seu esposo, Matheus Bazzo.

Nesta entrevista, ela compartilha como a maternidade intensificou a sua sensibilidade e transformou a sua trajetória no cinema. 

1. Você se lembra do momento em que decidiu que queria trabalhar com cinema? Como essa decisão colidiu com a maternidade?

Meu interesse pelo cinema veio desde muito cedo. Eu sempre assisti a muitos filmes. Alguns desses filmes me impactavam de um jeito tão profundo que despertavam em mim uma vontade de provocar nos outros o mesmo tipo de emoção. Sentia-me muito movida por esse desejo de criar histórias que pudessem também tocar a vida de outras pessoas. 

Segui minha vida profissional com esse sentimento como pano de fundo e, quando me casei, estávamos prestes a lançar a Lumine. Tive a oportunidade de me dedicar inteiramente à empresa no seu primeiro ano — foi um momento de entrega total à criação e ao propósito da Lumine. Logo em seguida, nasceu meu primeiro filho.

A pergunta sobre como essa decisão se cruzou ou colidiu com a minha jornada como mãe é ótima porque, na verdade, foi exatamente isso: uma colisão de mundos. Dois universos completamente diferentes se chocando. E, apesar do desafio de conciliar a maternidade com a vida criativa e empreendedora, percebo que foi justamente nesse encontro — ou talvez nesse conflito — que minha criatividade foi realmente colocada à prova.

2. Antes da maternidade, como você imaginava que seria conciliar a carreira no audiovisual com a vida de mãe?

Antes da maternidade, para ser honesta, eu não me preocupava muito com como seria conciliar a carreira com a vida de mãe. Meu foco sempre foi fazer o melhor com aquilo que estivesse ao meu alcance. Talvez tenha sido até uma ingenuidade não pensar que a vida de mãe teria implicações na minha vida profissional.

Porém, em certo sentido, alguns aprendizados da vida profissional me ajudaram quando me tornei mãe. No trabalho, somos constantemente chamadas a dar o nosso máximo e fazer as coisas com excelência. Ficou muito claro para mim, desde o início da minha carreira, que, para se destacar, você precisa ser excelente.

Vejo hoje que esse modo de se posicionar diante dos desafios me ajudou a pensar a vida como mãe. Independentemente da fase da vida ou do desafio, meu objetivo precisava ser esse de me entregar com excelência ao que estou fazendo. 

Como profissional, cada novo filme, cada novo projeto era (e ainda é) uma oportunidade. Então, eu não antecipei tanto como seria essa conciliação. Simplesmente segui com a certeza de que, onde eu estivesse, daria o meu melhor. 

3. O que muda no seu olhar como roteirista e diretora depois da maternidade?

Depois da maternidade, a vida adquiriu um peso diferente e, com isso, meu olhar como roteirista e diretora também mudou. Lembro de estar assistindo a um filme do diretor grego Theo Angelopoulos, em que havia uma cena em que uma criança estava perdida e um senhor tentava levá-la de volta aos pais — fui profundamente tocada por aquilo.

Aquela cena me atravessou de um jeito que, talvez, antes de ser mãe, não teria me atravessado com tanta força. A maternidade intensificou minha sensibilidade. Tudo passou a ser sentido com mais profundidade — a dor do personagem, o silêncio, a ausência, o amor.

O drama do mundo, a verdade humana, nos é revelada de forma mais crua quando nos tornamos pais. Isso transforma a maneira como contamos histórias. Passamos a enxergar nuances que talvez antes passassem despercebidas.

Os filhos nos trazem isso, eles nos jogam diante desse drama e dessa beleza que é a vida. Sem esse referencial da maternidade, eu talvez nunca tivesse noção da gravidade real das coisas. É natural que essa consciência também me ajude no trabalho como roteirista porque, ao construir um personagem, eu tenho mais material humano para compreender seu mundo, suas questões, etc.

4. Já se sentiu dividida entre estar num set e estar em casa? Como lida com essa divisão emocional?

Cada mãe carrega uma história única, com desafios e descobertas muito próprios. A maternidade, com toda sua beleza, também nos apresenta fases desafiadoras. Em meio a tudo isso, algo que procuro sempre lembrar é que essas fases, por mais difíceis que pareçam, são passageiras.

Quando meu primeiro filho nasceu, minha rotina e minhas responsabilidades haviam mudado e, naquele momento, isso me levou a redirecionar minha atuação. Passei a trabalhar mais intensamente com roteiro, que permite uma flexibilidade maior, e a me afastar dos sets — que exigem longas horas de concentração e presença física, algo que minha realidade naquele momento não permitia.

Comecei então a focar mais na pré e pós-produção. De forma muito natural, comecei a me dedicar mais aos conteúdos da Lumine Kids. Como grande parte dessas produções — especialmente as animações — acontecem quase totalmente online, encontrei ali uma forma de adaptar o processo cinematográfico à minha nova realidade.

Essa divisão emocional entre estar no set e estar em casa existe, sim, mas busquei transformá-la em uma adaptação consciente, entendendo que há tempo para tudo.

5. Existe alguma cena que você escreveu ou dirigiu que hoje enxerga de um jeito totalmente novo por causa da maternidade?

Acredito que não — mas, ao mesmo tempo, percebo como a maternidade está profundamente entrelaçada com o que crio. Muitas vezes, situações da minha própria vida acabam se transformando em parte das nossas produções.

Um exemplo disso é o filme e livro infantil da Lumine, O Mistério do Sino que Nunca Parava de Tocar. Ele foi inspirado no meu filho mais velho, que, quando pequeno, era completamente fascinado por sinos. 

Passava o dia brincando com os oito sinos que ganhou de aniversário de uma amiga minha, e, à noite, me pedia histórias sobre sinos. Foi nesse ritual de contar e recontar histórias que esse filme foi nascendo. Quando percebi, eu estava com uma história pronta.

Icone

Receba nossos e-mails

Novos artigos, recomendações de filmes, trailers, lançamentos e muito mais. Não muito — apenas o suficiente.

Mais Artigos

|
26.maio.2025

5 grandes filmes sobre Nossa Senhora

Nenhuma criatura no Céu ou na Terra foi tão próxima de Deus quanto Maria.

Por Redação Lumine

Ler artigo
|
23.maio.2025

John Henry Newman — diário de produção — dia 7: Dublin

Confira como foi a gravação do documentário sobre São John Henry Newman na cidade de Dublin.

Por Padre Juan Velez

Ler artigo
|
23.maio.2025

“Conversando com Ozu”: o legado atemporal do mestre japonês

No filme "Conversando com Ozu", conheça a influência atemporal do mestre japonês, cuja obra marcou gerações de cineastas no mundo todo.

Por Leandro Costa

Ler artigo