Spielberg e o amor pela família
Por Francisco Escorsim
|
20.maio.2025
Midle Dot

Deixa eu retomar uma conversa aqui de textos atrás, quando comecei a falar de experiência estética e minha primeira memória viva com o cinema, assistindo E.T. Caso tenha perdido, é este post aqui.     

Algo que pode ajudar a “participar” do filme – ou melhorar essa participação – é conhecer mais da filmografia e biografia do diretor. Fico no exemplo do E.T. 

A origem autobiográfica de The Fabelmans

Hoje, é possível conhecer melhor quem era o Steven Spielberg daquela época por causa de seu último filme, de 2022, The Fabelmans, autobiográfico de sua infância e juventude, contando a história de sua família e do início da descoberta e realização de sua vocação de cineasta. 

Quase tudo em Os Fabelmans aconteceu mesmo. A mãe do diretor era daquele jeito e fez o que fez (sim, até o macaco de estimação ela teve). Não foi fácil para Steven, suas irmãs e o filme retrata em parte esse sofrimento. O que viveu foi tão impactante que durante toda sua carreira tentou contar essa história. 

Depois dos sucessos com Tubarão, de 1975, e Contatos Imediatos de Terceiro Grau, de 1977, queria filmar sua história, que chamaria de Growing Up, que poderia ser traduzido como “Virando Adulto”. O projeto acabou sendo deixado para realizar outros, mas a ideia permaneceria com ele, tendo retornado em 1980, com o avanço das filmagens de Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida, para logo suspender mais uma vez.

Por que Spielberg demorou décadas para contar sua história

Só começou a ganhar corpo mesmo em 1999, quando em conjunto com sua irmã, Anne, escreveu o roteiro do que seria I’ll Be Home, tendo dito em entrevista a respeito: Meu grande medo é que minha mãe e meu pai não gostem, pensem que é um insulto e não compartilhem meu ponto de vista amoroso, mas crítico, sobre como foi crescer com eles.”

Esse receio foi mais forte, tendo dito em 2002 que estava inseguro sobre fazer I’ll Be Home: “É tão próximo da minha vida e tão próximo da minha família — prefiro fazer filmes que sejam mais análogos. Mas uma história literal sobre minha família exigirá muita coragem.” Nem com seus pais pedindo para que filmasse, Steven conseguiu. 

Somente quando ambos faleceram – a mãe em 2017 e o pai em 2020 -, enfim se permitiu: “Comecei a pensar seriamente: se eu tivesse que fazer um filme que ainda não fiz, algo que eu realmente quero fazer em um nível atômico muito pessoal, qual seria? E havia apenas uma história que eu realmente queria contar… Minha vida com minha mãe e meu pai me ensinou uma lição, que espero que este filme, de uma pequena forma, transmita… Que é: quando um jovem em uma família começa a ver seus pais como seres humanos? No meu caso, por causa do que aconteceu entre as idades de 7 e 18, comecei a apreciar minha mãe e meu pai não como pais, mas como pessoas reais.”

Assim surgiu The Fabelmans, que é uma espécie de “carta de amor” aos pais que termina com uma ação de graças ao cinema, que agora podemos enxergar como também foi sua salvação naquele período.

O elo emocional entre E.T. e sua infância

A partir de The Fabelmans, toda a cinematografia anterior do diretor ganhou novas camadas de sentido, principalmente E.T. Quando teve a ideia deste filme, durante as filmagens do primeiro Indiana Jones, já era uma elaboração do que vivera na infância, pois teve um amigo alienígena imaginário que poderia ser o irmão que nunca teve (somente teve irmãs) ou um pai – já que o real não sentia mais presente em sua vida.

Quando assistimos E.T. sabendo disso, o filme ganha uma profundidade dramática que estava ali já, mas não tão evidente. A mãe se virando com os filhos, a casa como um protagonista da história, as crianças tendo de resolver as situações praticamente sozinhas, a profunda conexão entre Elliot e o alienígena, a dor da despedida entre ambos, o desejo de “voltar para casa” e, principalmente, o amor verdadeiramente vivido, dando forma à obra.

“Participar” de E.T. é sofrer com Elliot, sentindo seu medo, sua dor, mas também aceitando a impossibilidade da vida continuar como era, sem que isso signifique perder a capacidade de amar, pelo contrário, é um aprendizado de amor. 

Na vida real, Steven salvou seu amor pelos pais ao ter compaixão pelo homem e a mulher falhos que eram (como todo ser humano é), mas com E.T. a compaixão se transfigura em um amor mais forte, altruísta e incondicional, como se também o pai e a mãe estivessem voltando para casa.    

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Algo que pode ajudar a “participar” do filme – ou melhorar essa participação – é conhecer mais da filmografia e biografia do diretor. Fico no exemplo do E.T. 

A origem autobiográfica de The Fabelmans

Hoje, é possível conhecer melhor quem era o Steven Spielberg daquela época por causa de seu último filme, de 2022, The Fabelmans, autobiográfico de sua infância e juventude, contando a história de sua família e do início da descoberta e realização de sua vocação de cineasta. 

Quase tudo em Os Fabelmans aconteceu mesmo. A mãe do diretor era daquele jeito e fez o que fez (sim, até o macaco de estimação ela teve). Não foi fácil para Steven, suas irmãs e o filme retrata em parte esse sofrimento. O que viveu foi tão impactante que durante toda sua carreira tentou contar essa história. 

Depois dos sucessos com Tubarão, de 1975, e Contatos Imediatos de Terceiro Grau, de 1977, queria filmar sua história, que chamaria de Growing Up, que poderia ser traduzido como “Virando Adulto”. O projeto acabou sendo deixado para realizar outros, mas a ideia permaneceria com ele, tendo retornado em 1980, com o avanço das filmagens de Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida, para logo suspender mais uma vez.

Por que Spielberg demorou décadas para contar sua história

Só começou a ganhar corpo mesmo em 1999, quando em conjunto com sua irmã, Anne, escreveu o roteiro do que seria I’ll Be Home, tendo dito em entrevista a respeito: Meu grande medo é que minha mãe e meu pai não gostem, pensem que é um insulto e não compartilhem meu ponto de vista amoroso, mas crítico, sobre como foi crescer com eles.”

Esse receio foi mais forte, tendo dito em 2002 que estava inseguro sobre fazer I’ll Be Home: “É tão próximo da minha vida e tão próximo da minha família — prefiro fazer filmes que sejam mais análogos. Mas uma história literal sobre minha família exigirá muita coragem.” Nem com seus pais pedindo para que filmasse, Steven conseguiu. 

Somente quando ambos faleceram – a mãe em 2017 e o pai em 2020 -, enfim se permitiu: “Comecei a pensar seriamente: se eu tivesse que fazer um filme que ainda não fiz, algo que eu realmente quero fazer em um nível atômico muito pessoal, qual seria? E havia apenas uma história que eu realmente queria contar… Minha vida com minha mãe e meu pai me ensinou uma lição, que espero que este filme, de uma pequena forma, transmita… Que é: quando um jovem em uma família começa a ver seus pais como seres humanos? No meu caso, por causa do que aconteceu entre as idades de 7 e 18, comecei a apreciar minha mãe e meu pai não como pais, mas como pessoas reais.”

Assim surgiu The Fabelmans, que é uma espécie de “carta de amor” aos pais que termina com uma ação de graças ao cinema, que agora podemos enxergar como também foi sua salvação naquele período.

O elo emocional entre E.T. e sua infância

A partir de The Fabelmans, toda a cinematografia anterior do diretor ganhou novas camadas de sentido, principalmente E.T. Quando teve a ideia deste filme, durante as filmagens do primeiro Indiana Jones, já era uma elaboração do que vivera na infância, pois teve um amigo alienígena imaginário que poderia ser o irmão que nunca teve (somente teve irmãs) ou um pai – já que o real não sentia mais presente em sua vida.

Quando assistimos E.T. sabendo disso, o filme ganha uma profundidade dramática que estava ali já, mas não tão evidente. A mãe se virando com os filhos, a casa como um protagonista da história, as crianças tendo de resolver as situações praticamente sozinhas, a profunda conexão entre Elliot e o alienígena, a dor da despedida entre ambos, o desejo de “voltar para casa” e, principalmente, o amor verdadeiramente vivido, dando forma à obra.

“Participar” de E.T. é sofrer com Elliot, sentindo seu medo, sua dor, mas também aceitando a impossibilidade da vida continuar como era, sem que isso signifique perder a capacidade de amar, pelo contrário, é um aprendizado de amor. 

Na vida real, Steven salvou seu amor pelos pais ao ter compaixão pelo homem e a mulher falhos que eram (como todo ser humano é), mas com E.T. a compaixão se transfigura em um amor mais forte, altruísta e incondicional, como se também o pai e a mãe estivessem voltando para casa.    

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